por Cine31.
O principal criticismo que tenho lido em blogs é que Abrams não fez um remake passo a passo de E.T. - O Extraterrestre (1982). Basicamente é isso que transparece de muitos textos que li. E acredito que Abrams seria crucificado se tivesse feito uma espécie de remake. Preso por ter cão, e preso por não ter. Claro que não estou a dizer que o filme não tem problemas, claro que tem.
No entanto, causa-me impressão tanta gente defender que o filme é apenas uma cópia barata do cinema de grande espectáculo de décadas atrás, a imitar filmes que são hoje clássicos, e a ideia que desde então o cinema americano mainstream não produziu - e não pode produzir - mais nada com a qualidade e "magia" de então. Além do factor nostalgia, a ideia do "no meu tempo é que era", há uma grande dose de má vontade.
A relação do alien com os protagonistas humanos é radicalmente diferente da de ET, por exemplo. A criatura durante a maioria do filme faz aparições fugazes e inesperadas, e o seu modo de "confraternizar" é bem diferente do fofinho ET de Spielberg. O filme é nostálgico, mas sem medo da modernidade, com uma sequência de um acidente explosivamente caótica e impressionante, impossível de filmar há trinta anos. Quem (como eu) já fez as suas curtas-metragens caseiras (e não me refiro a filmes "para adultos") ainda se vai identificar mais com o filme. Hoje em dia, qualquer pessoa tem um câmara de video ou telemóvel para gravar as suas aventuras quotidianas e publicar no Youtube para milhões verem. Mas em 1979, época em que "Super 8" se desenrola, as coisas eram diferentes.
"Super 8" é, mais que uma homenagem a Spielberg [um dos produtores e impulsionadores de "Super 8",que na época de acção do filme ainda só tinha dois êxitos: "Tubarão" e "Encontros Imediatos..."], uma recordação autobiográfica de Abrams, que - como Spielberg antes dele - cresceu a fazer os seus próprios filmes amadores com os amigos. No filme fez-se representar por duas personagens: os melhores amigos Charles (o realizador do filme de zombies dentro do filme) e Joe, o protagonista. Durante a metragem está sempre presente o espectro da trágica e recente morte da mãe de Joe Lamb (Joel Courtney) , agora a cargo do pai, policia da fictícia cidade de Lillian, Ohio. Um dos escapes de Joe é ajudar o vizinho Charles (Riley Griffiths) na execução de uma curta metragem de zombies, "The Case", filmada - claro está - em formato Super 8. Charles sempre em busca de melhorar os "valores de produção" da curta, convida Alice (Elle Fanning) - o alvo da paixoneta de Joe e Charles - para actuar no filme. A química entre o trio é um dos pontos fortes de "Super 8", e não perde destaque, mesmo quando o terrível acidente de comboio e a fuga da misteriosa carga desencadeiam uma série de acontecimentos que vão alterar a pacata cidadezinha, a braços com um monstro, desaparecimentos de pessoas e equipamentos e a hostilidade das forças militares que sitiam Lillian.
O que podia ser uma simples colagem de sequências de homenagem a clássicos é um filme com identidade própria, um belo grupo de actores mirím, que apesar de obviamente não ter o efeito novidade dos filmes que homenagia, e de perder o ritmo e o foco por momentos, é um entretenimento de grande qualidade. Aplaudo a coragem de fazer um filme diferente da corrente actual. E claro, vejam os créditos finais, durante os quais é exibida a divertida versão integral de "The Case".
A quem ainda está em estado de choque porque os "Cahiers do Cinema" incluíram o filme na lista dos melhores do ano, recomendo um chazinho, que isso passa.